Descrição
A artista Lenir de Miranda volta a expor no Museu de Arte Contemporânea do Rio Grande do Sul sua sempre intensa produção pictórica. O impulso literário da sua pintura – freqüentemente associada aos textos das narrativas de Homero e Joyce, onde Ulisses personificava o centro de toda figuração que flutua nas telas é vista agora renovada beirando a quase desumanização na sua nova série, dita fragmentária, de trabalhos expostos em Terra Desolada – pintura, fragmentos, instalação. No entanto, a artista ainda preserva o elemento humano básico, que emerge da profundidade das leituras, dedicando obsessiva atenção ao conceitual, embora com habilidade e técnica de grande densidade expressiva. Lenir gosta de dizer que faz tudo ela mesma, talvez por isto que faça além, trabalhando sua sagaz pintura em todos os meios concebíveis, como tapetes, chapas metálicas, crinas de cavalo, galhos secos, entre outros materiais que opera com vigor extremo em suas colagens e assemblagens. Nas histórias que contam – e a narrativa é um componente central aqui – a ficção clássica é trazida do imaginário ao mundo real, condensadas na materialidade de suas obras. Em um tempo que nossas vidas são moldadas por tecnologias digitais, que visitamos sites para conhecer os artistas e museus, as obras de Lenir de Miranda ainda pedem a visita ao ateliê, ao lugar de onde partiram. Transportá-las da histórica Pelotas para as salas do MAC, é bem dizer parte do que elas são – uma odisséia permanente ao que ainda desconhecemos do mundo. Talvez estejamos na frente de obras que têm como princípio provocar o quanto não entendemos a nós mesmos. Lenir, contudo, não perde seu fio condutor, aquele que ao nos levar por esta viagem sem fim, preserva e renova em nosso olhar os códigos pictóricos, reunidos entre os fragmentos e as instalações que acompanham solidários suas pinturas. A artista retrocede a figura do mito fundador, de civilizações arcaicas, acessando uma dimensão íntima do ser, onde podemos reencontrar e até descobrir novas fronteiras e limites que, agora, inspiradas na poesia Wast Land de T.S. Eliot, convidam-nos a devastar a terra de uma existência (própria ou alheia), porém ainda ignorada. Lenir de Miranda não está preocupada com a pureza da linguagem, ao contrário, é mestra de uma produção excêntrica, tanto territorialmente, como na forma e concepção, pois não leva o mundo, mas o traz em suas pinturas, desenhos, assemblagens, instalações e livros. A bicentenária Pelotas, cidade homenageada por ser berço permanente de importantes artistas, comemora hoje uma das suas cidadãs honorárias mais ilustres, que tem sua obra presente em diversos museus e coleções particulares pelo mundo afora. O MACRS sente-se orgulhoso de realizar esta dupla homenagem e agradece à artista pela oportunidade do reencontro com o Museu e o seu público.