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Guarde seus olhos
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Anexos
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EV2017.09
Título
Guarde seus olhos
Tipo de atividade
Ano
2017
Período
Início
15/09/2017
Término
19/11/2017
Artistas/Participantes
Curadoria
Realização
AAMACRS
|Realização: Museu de Arte Contemporânea do Rio Grande do Sul
Origem das obras
Descrição
O encontro com a obra de Felipe Caldas não é pacífico. O espectador é colocado diante do insólito, e o jogo instaura-se e situa-se entre decifrar o simbólico que emerge das pinturas ou absorver o que tais pinturas manifestam como procedimento plástico e experimental.
Felipe Caldas trabalha com um repertório próprio na construção das imagens, sua pintura fala de si e do mundo à sua volta. Antes de qualquer análise mais atenta ao conceito contido nas pinturas, é dela própria que ele nos propõe pensar. A pintura é forte, densa, sugere uma fruição meticulosa, já que esta levará o observador por caminhos inquietantes na tentativa de desvelar o sentido da obra. Não interessa a durabilidade da pintura, ela é o campo de batalha para o artista, em que vale tudo. Ele usa materiais alheios à pintura, como a gasolina, apenas para citar um. Riscar, arranhar, sobrepor, justapor, manchar e sujar, fazem parte do ato. Os materiais são usados para garantir efeitos nas pinturas, o papel absorve tudo, e as intensas investidas sobre ele podem causar danos como rasgos ou manchas. Tudo faz parte do processo e mesmo o pó e outros acasos são incorporados às camadas de tinta. Ora ele pinta com o papel esticado na parede, ora no chão, andando à sua volta, construindo e desconstruindo as figuras. Em um jogo mais intelectual do que perceptivo, o embate entre a figura e o fundo fica evidente. A pintura é vigorosa e aglutina-se em manchas, às vezes vermelho-sangue, pendendo para o ritual, o sacrifício; outras vezes brancas ou em tons claros para despistar o que está embaixo. A collage (ou colagem) pode aparecer como elemento constitutivo da obra, ou seja, um pedaço mesmo de outro trabalho pode vir agora ocupar um espaço. É como se o tempo deslocasse um pedaço do passado de Felipe Caldas para colocar em uma nova cena, em uma outra ação.
Ao usar animais e figuras que ora aparecem no centro da pintura, ora escondidos entre as camadas de tinta, desconstrói o seu universo pessoal em detrimento da construção pictórica. Os elementos que interessam ao artista são jogados no papel e trabalhados com intensidade por meio de pinceladas agressivas que por vezes obrigam os personagens a ficar ali juntos, mesmo que venham de lugares e tempos diferentes, mas agora eles são o momento presente da pintura.
A pesquisa faz parte da sua vida acadêmica, porque se dedica paralelamente à teoria e história da arte e às poéticas em que trabalha com o desenho e a pintura; trabalha concomitantemente nas duas áreas e suas pesquisas andam a pari passu no decorrer dos últimos anos.
Nesta exposição, discute questões específicas da pintura, ou como ele costuma chamar em alguns trabalhos a “desenhura”, ou seja, a pintura em que aparecem grafismos ou desenhos, pois mesmo na pintura, a questão da linha aparece como uma herança do desenho. A pintura é gestual e matérica em certa medida, apesar de usar o papel como suporte. Os desenhos que introduz nesta série são códigos, fórmulas, números que lhe dizem respeito, e suas presenças causam pequenos desvios de atenção – sutilezas na obra – que ficam à deriva na mente de quem olha.
A fragmentação é o aspecto de relevância nas obras, visto que pode se estabelecer algumas relações com questões da religiosidade, ou da afro-brasilidade, em que destacam a iconografia, a arte simbólica e alegórica. A fragmentação constitui-se como uma característica do mundo contemporâneo, em que o fluxo de imagens se torna descontínuo, e o espaço-temporal faz-se o instaurador da obra. A pintura concentra-se em fragmentos de imagens. Ou dito de outra forma, a visão fragmentada de Felipe Caldas traz o aspecto diferencial para as pinturas.
São visões que trazem de sua memória afetiva os ícones que usa. Dentro do ambiente caótico das pinturas, ele estabelece como acontece o olhar para si e para o outro. Os olhos dos personagens, quer sejam de gente ou animais, brincam com quem os olha. Eles estão velados por vezes instigando à curiosidade ou fixos como se penetrassem na alma de quem observa.
Uma figura emerge do fundo, e os olhos dela estão cobertos por uma pincelada de tinta causando inquietação. Esse jogo do olhar e ser olhado se revela a partir das imagens, já que são ambivalentes e causam desassossego. A singularidade está entre o que vemos e o que nos olha. Aquilo que nos olha se revela como uma presença invasora que nos mantém a certa distância. (Didi-Hubermann, 1998).
O efeito de estranheza das pinturas está no seu aspecto inacabado, em que gente e animais emergem entre uma mancha e outra, bem como na potência das cores fortes. Das Umheimliche é o termo alemão que nas teorias Freudianas designavam “o estranho”. As palavras que se aproximam desse conceito são esquisito, misterioso, inquietante, etc. Justamente na série que compõem a exposição Guarde seus Olhos, o familiar e o desconhecido contrapõem-se. Não há certezas absolutas na obra de Felipe Caldas, pois Guarde seus olhos instaura o olhar e o ser olhado. A própria pintura chama a atenção para a técnica sem deixar que o assunto seja menos instigante e questionador.
As figuras esperam o que talvez ele mesmo anseie: a purificação, o devir, e isso pode se dar através da instalação de carvão e ossos que ocupa o espaço em frente as pinturas como uma provocação. Estariam ali implícitas questões de presença e ausência? Seria o desaparecimento da matéria a questão primordial dessa instalação? Guarde seus olhos...
Condições de reprodução
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